sexta-feira, 21 de dezembro de 2007

Recesso do CURTAS e Feliz 2008


Caro(a) leitor(a),

comunicamos que a redação do CURTAS estará de recesso entre os dias 24 de dezembro de 2007 e 7 de janeiro de 2008.

Atenciosamente, a Redação

Dom Cappio sai da UTI e deve participar de celebração hoje

O bispo Dom Luiz Cappio foi removido, na manhã de hoje (21), da Unidade de Tratamento Intensivo (UTI) para um quarto do Hospital Memorial, em Petrolina, PE, onde foi internado ontem à noite, após ter sofrido um desmaio no início da tarde, dormido por mais de duas horas e não ter conseguido estabelecer pleno estado de consciência. À noite, ele deve participar da celebração na Capela São Francisco, em Sobradinho, BA, local em que permaneceu em jejum por 23 dias.

Logo mais, quando retornar ao município, Dom Luiz deverá falar sobre o gesto que motivou atos e manifestações em todo o Brasil e em outros países. As celebrações, como a que será realizada no início da noite, acontecem desde o dia 27 de novembro, quando o Dom Cappio deu início ao jejum em defesa do rio São Francisco e contra o projeto de transposição de suas águas.

Desalento e tristeza

O estado físico de Dom Luiz se complicou mais após receber a notícia sobre a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), que liberou, por 6 votos a 3, o início das obras do mega projeto de transposição. Ao saber da decisão do STF Dom Cappio disse que sentia desalento e tristeza. Atualmente o frei está consciente, mas ainda frágil e em observação. A sua primeira fala sobre o assunto será feita durante a celebração desta noite.

Conheça, abaixo, a proposta de Dom Luiz Cappio e dos Movimentos Sociais para o projeto do governo de transpor as águas do Velho Chico

Contra-proposta de Dom Luiz Cappio e dos Movimentos Sociais Face à proposta feita pelo Governo Federal, através do Chefe de Gabinete da Presidência da República, Sr. Gilberto Carvalho, para suspensão do jejum de Dom Luiz Cappio

Tendo em vista a solução real para o déficit hídrico e o desafio do desenvolvimento socioambiental sustentável do Semi-árido e da Bacia do Rio São Francisco;

Baseados na proposta feita pela Caravana em Defesa do Rio São Francisco e do Semi-Árido - Contra a Transposição (27/07/2007);

Para alimentar o diálogo e o entendimento; Dom Luiz Cappio e os Movimentos Sociais que o acompanham e assessoram – MPA, MAB, MST, APOINME, CPT, CIMI, CPP, PJMP e FEAB –apresentam a seguinte contraproposta:

1- Manter a suspensão das obras iniciadas da transposição, com a retirada imediata das tropas do Exército;

2- Adução de 9m3/s para as áreas de maior déficit hídrico dos Estados de Pernambuco e da Paraíba, redimensionando o projeto atual de 28m3/s, através de termo de ajustamento entre o empreendedor e o Ministério Público Federal com interveniência dos Estados da Bacia, do Estado da Paraíba e do Comitê de Bacia Hidrográfica do São Francisco;

3- Implementação das obras previstas no Atlas Nordeste de Abastecimento Urbano de Água, da Agência Nacional de Águas, além das já referidas acima no item 2;

4- Apoio da União à introdução, ampliação e difusão de tecnologias apropriadas de captação, armazenamento e manejo de água para o abastecimento hídrico humano e produção agropecuária das comunidades camponesas do Semi-Árido, sob controle da ASA – Articulação do Semi-Árido Brasileiro e dos movimentos sociais;

5- Elaboração e implementação de um programa de revitalização da Bacia Hidrográfica do São Francisco, que comporte ações amplas e diversificadas, a curto, médio e longo prazo, e contemple a preservação dos Cerrados e das Caatingas, tornados Biomas Nacionais, tendo como suporte orçamentário o Fundo de Revitalização do Rio São Francisco, conforme a PEC a ser aprovada imediatamente no Congresso Nacional;

6- Elaboração e implementação de Programas de Revitalização das Bacias Hidrográficas dos Rios Jaquaribe no Ceará, Piranhas-Açu na Paraíba e Rio Grande do Norte e Parnaíba no Piauí e Maranhão, e rios temporários do Semi-árido;

7- Apoio técnico-político ao Comitê de Bacia Hidrográfica do São Francisco para elaboração do Pacto de Gestão das Águas do São Francisco com inclusão imediata do atendimento às demandas para abastecimento humano do estado da Paraíba e do Pernambuco e consideração dos pleitos dos estados do Ceará e Rio Grande do Norte para abastecimento humano e dessedentação de animais;

8- Coordenação pela União da elaboração e implementação de um Plano de Desenvolvimento Socioambiental Sustentável para todo o Semi-Árido Brasileiro, conforme o paradigma da Convivência com o Semi-árido.

Sobradinho, 18 de dezembro de 2007.

quinta-feira, 20 de dezembro de 2007

Proposta de gestão compartilhada de Unidades de Conservação sofre revés

A proposta de Resolução em trâmite no Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama), que dispõe sobre a gestão compartilhada de Unidades de Conservação com Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público (Oscip) retornará à Câmara Técnica de Assuntos Jurídicos (CTAJ). Este é um dos destaques do Relato da 88ª Reunião Ordinária do CONAMA, apresentado pelo Instituto Oca Brasil.

O processo retornará à Câmara por não ter havido tempo para esgotar a discussão. Mas a proposta também deve sofrer uma considerável mudança, com a supressão de dispositivos que tratam de matérias que foram consideradas fora da competência do Conama. O retorno da proposta de resolução à CTAJ causou estranheza entre alguns conselheiros. Afinal, a matéria já havia sido analisada pela Câmara em outras oportunidades, tendo chegado, inclusive, ao plenário do Conama para votação.

Outro destaque foi a aprovação de moção solicitando ao Órgão Ambiental do Estado de Goiás esclarecimentos sobre a implantação de rede elétrica em parte da RPPN Cara Preta, administrada pela Oca, no município de Alto Paraíso, sem qualquer comunicação ou autorização do proprietário.

A reunião do Conama ocorreu nos dias 27 e 28 de novembro e o relato divulgado pela Oca é assinado pela conselheira Christina Chiodi, representante da Rede Cerrado no conselho.

Leia aqui o relato na íntegra.

quarta-feira, 19 de dezembro de 2007

O Cerrado do Piauí pede socorro

Matas transformadas em deserto.

O biólogo Ivan de Marche (Instituto Vidágua – SP), membro da atual Coordenação da Rede Cerrado, participou do 2º Seminário sobre Desenvolvimento Territorial Rural Sustentável dos Cerrados. O evento foi realizado no município de Floriano, no centro do Piauí, entre os dias 12 e 14 de dezembro.

Desde o ano passado, foi criado um fórum da sociedade civil (ONGs e pequenos produtores rurais), em diálogo com órgãos governamentais e organismos internacionais, para tratar da situação do Cerrado piauiense, frente ao avanço da fronteira agrícola e seus impactos socioambientais.

Segundo Ivan, a região central do Piauí é uma das mais pobres do estado. Com a instalação da Bunge, o município conseguiu aumentar sua arrecadação, mas às custas de muita devastação ambiental. Denúncias de desmatamento ilegal, contaminação dos solos e das águas, somadas as de trabalho escravo e grilagem de terras se amontoam na mesa de promotores da região.

"Os representantes do Ibama também estiveram presentes e foi colocada a necessidade da criação de Unidades de Conservação no estado para garantir que o Cerrado possa vencer essa batalha com o agronegócio". Para Ivan, existe uma "falta de vontade" do governo estadual em criar novas Unidades de Conservação. "O cenário está propício para criação, porque as terras da região têm valor muito baixo em comparação com outras regiões do país, o que favorece as desapropriações".

O Fórum de Desenvolvimento Territorial Rural Sustentável dos Cerrados solicitou sua filiação na Rede Cerrado, como forma de estimular o desenvolvimento sustentável para o bioma. Os participantes referendaram a participação.

terça-feira, 18 de dezembro de 2007

Mobilização dos Povos Indígenas do Cerrado realiza sua primeira Assembléia Geral


A MOPIC, Mobilização dos Povos Indígenas do Cerrado, realizou entre os dias 10 a 13 de dezembro sua 1a. Assembléia Geral na Aldeia Cachoeirinha - T.I. Terena, em Miranda, MS. O encontro contou com a participação de 200 pessoas de 25 povos indígenas dos estados do MS, MT, TO, MA e MG.

No dia 14 de dezembro houve uma Corrida de Toras de Buriti na cidade de Campo Grande e o bloqueio de 4 vias da principal avenida da cidade, Afonso Pena. O principal objetivo do protesto foi chamar atenção dos órgãos governamentais, sociedade civil e meios de comunicação sobre os graves impactos que a produção de biocombustíveis vêm causando às T.Indígenas do Cerrado, assim como exigir a soltura imediata dos presos indígenas (Guarani-Kaiowá) .

Leia também a Carta dos Povos Indígenas do Cerrado, com as reivindicações e posicionamentos políticos que resultaram do evento.

segunda-feira, 17 de dezembro de 2007

PPP-ECOS apoiará 29 novos projetos comunitários no Cerrado em 2008

Em 13 anos, PPP-ECOS já investiu R$ 5,5 milhões para criar modos de vida sustentáveis no bioma considerado um dos mais ricos em biodiversidade do mundo.

O Programa de Pequenos Projetos Ecossociais (PPP-ECOS) apoiará 29 novos projetos comunitários no Cerrado e áreas de transição no ano que vem. Os recursos destinados a grupos indígenas, comunidades tradicionais e agroextrativistas em 2008 somam US$ 810 mil.

Os beneficiários foram escolhidos entre as 205 propostas enviadas em resposta ao edital de 2007. Foram 68 candidatos a mais em relação ao edital do ano passado, que recebeu 137 projetos. Os recursos são sete vezes maiores do que a atual capacidade financeira do PPP-ECOS.

“Isso significa que o programa cumpre um importante papel socioambiental no país, preenchendo lacunas fundamentais deixadas pelo Estado”, avalia Andréa Lobo, presidente do Instituto Sociedade, População e Natureza (ISPN), organização que coordena o PPP-ECOS no Brasil.

Os recursos serão aplicados em projetos voltados à promoção de modos de vida sustentáveis que aliam desenvolvimento socioeconômico à conservação ambiental. Projetos de desenvolvimento de inovações em tecnologias sociais, organização comunitária e produtiva, valorização e afirmação cultural e étnica têm recebido apoio do programa,

Este ano, alguns dos projetos selecionados apoiarão o uso comunitário sustentável de plantas medicinais, agroextrativismo de frutos nativos voltado à industrialização, desenvolvimento de turismo comunitário em sítios arqueológicos, uso sustentável de plantas aromáticas e medicinais para a industrialização de cosméticos. Projetos de agroecologia, recuperação de nascentes e áreas degradas, e fortalecimento de organizações indígenas do Cerrado também serão beneficiados pelo PPP-ECOS em 2008.

Os projetos serão implementados no bioma Cerrado e em áreas de transição. Os projetos do edital de 2007 serão executados em Goiás, Tocantins, Distrito Federal, Mato Grosso, Minas Gerais, Mato Grosso do Sul, Maranhão, Piauí, Ceará e Rondônia. Por terem caráter comunitário, os projetos envolvem dezenas de famílias. As iniciativas ajudarão a manter as populações no campo, garantido geração de renda e segurança alimentar, a partir do uso sustentável da biodiversidade por meio do agroextrativismo.

Para selecionar os projetos, o PPP-ECOS conta com o apoio técnico e científico de 12 especialistas de instituições ligadas ao tema do desenvolvimento sustentável, povos tradicionais e políticas públicas no Cerrado. Representantes do governo brasileiro também são chamados para analisar as propostas, garantindo transparência às decisões do PPP-ECOS.

.: fonte: ISPN.

sexta-feira, 14 de dezembro de 2007

Conservar a Amazônia, devastar o Cerrado?

Por Washington Novaes

Haverá algum acordo em Bali, na Indonésia, onde representantes de mais de 180 países estarão até dia 14 em mais uma reunião da convenção do clima, na tentativa de um novo compromisso para reduzir as emissões de gases poluentes que intensificam o efeito estufa? É muito difícil prever, não só pela dificuldade de chegar a consensos, mas também pelo fato de que nenhum país costuma abrir seu jogo até a última hora.

Já há quase unanimidade no diagnóstico: será preciso reduzir as emissões em pelo menos 50% até meados do século, para evitar que a temperatura planetária se eleve mais de 2 graus (já subiu quase 0,8 graus Celsius, por causa de ações humanas); se passar daí, a intensificação de secas, inundações, furacões e a elevação do nível dos oceanos – que já é muito grave em toda parte – tenderá a ser ainda mais grave e danosa para bilhões de pessoas. Mas as emissões continuam aumentando e poderão aumentar ainda mais, com o crescimento do consumo de combustíveis fósseis (gasolina, diesel, carvão mineral, gás natural) em grande parte do mundo, mas principalmente na China, Índia e outros países "em desenvolvimento".

Até aqui, o Brasil, como a China e a Índia, vem dizendo que não aceita compromissos de reduzir nossas emissões (já somos o quarto maior emissor do planeta, com 75% das nossas emissões fruto de desmatamentos, mudanças no uso da terra e queimadas). Propõe que os países ricos criem um fundo para financiar a conservação da Amazônia e a redução do desmatamento ("ilegal", acentua a ministra Marina Silva, deixando subentendido que não se pretende evitar o desmatamento em 20% das áreas privadas de florestas, como permite a lei). Não será fácil. Quem se disporá a financiar algo se não houver compromisso específico de redução do desmatamento? Diz o ministro Mangabeira Unger que o governo fará um "zoneamento ecológico/econômico" na Amazônia, para dizer o que pode e não pode ser feito em cada área, pois são "muitas amazônias". Mas só estará pronto no segundo semestre do ano que vem.

Curioso é que em toda essa discussão não se fale uma palavra sobre o Cerrado – quando ele é o segundo maior bioma brasileiro (mais de 2 milhões de quilômetros quadrados), tem cerca de um terço da nossa biodiversidade mas sofre um desmatamento intensíssimo, com reflexos na temperatura, no clima, na perda dessa biodiversidade, no fluxo hidrológico (14% das águas que correm no Brasil nascem no Cerrado).

O silêncio é parte de uma postura ainda vigente em grande parte do país, que considera o Cerrado um bioma de segunda classe e prefere que o desmatamento e as queimadas nele ocorram, e não na Amazônia ou na Mata Atlântica. Uma evidência disso está em episódio provavelmente já contado neste espaço, quando se realizava, em 1992, uma teleconferência em Brasília, sobre o relatório brasileiro para a Rio 92. Quando um participante de Minas Gerais perguntou o que o governo pretendia fazer para coibir o desmatamento e as queimadas no Cerrado, a própria então presidente do Ibama (a quem cabia proteger o Cerrado), que dirigia a teleconferência, respondeu: "Ainda bem que é no Cerrado, e não na Amazônia. Se fosse na Amazônia seria muito pior." O autor destas linhas estava lá, viu e ouviu com seus próprios olhos e ouvidos.

De certa forma, de lá para cá nada mudou ou pouco mudou. Ainda na semana passada, um novo relatório do Instituto Sociedade, População e Natureza (ISPN), financiado pela Comunidade Européia, deixou claro que é muito preocupante o avanço da cana-de-açúcar e da pecuária em áreas prioritárias para a conservação e uso sustentável do Cerrado, com "comprometimento dos recursos naturais, de propriedades rurais e da segurança alimentar na região", além de áreas com ele conectadas, como o Pantanal, a Mata Atlântica e a Amazônia. O desmatamento anual no Cerrado – diz o documento – é maior que na Amazônia: 1,1% do bioma ou 22 mil quilômetros quadrados anuais (o último número conhecido da Amazônia aponta 14 mil km2 desmatados em um ano), uma área equivalente à do estado de Sergipe. Com 27 novas usinas de álcool em implantação no Estado de São Paulo, 31 já instaladas e 14 previstas em Minas Gerais, 17 implantadas e 23 previstas em Goiás, mais 10 implantadas e 15 em implantação em Mato Grosso do Sul – diz o relatório – a situação pode tornar-se muito grave. "O governo precisa redirecionar esse processo para áreas já alteradas", recomenda Donald Sawyer, do Centro de Desenvolvimento Sustentável da Universidade de Brasília.

E não é só a cana que preocupa. O boletim Agronegócio (26/11/07) afirma que o consumo de carvão pela indústria do ferro gusa de Minas Gerais fez desaparecer, entre 1997 e 2006, nada menos de 17,3 mil quilômetros quadrados de matas nativas. Só em 2007 já foram removidos 2.341 km2 em 16 Estados, inclusive em Goiás. A maior consumidora de carvão vegetal é a Gerdau, que faturou R$25 bilhões em nove meses deste ano e tem três unidades em Minas Gerais (O Estado de Minas, 8/11/07).

Ainda há poucos dias, ao informar que 33 municípios goianos já têm cobertura vegetal inferior a 5% de seu território, este jornal lembrou que menos de um terço da vegetação nativa do Estado está conservado. Só no ano passado, a Agência Ambiental autorizou o desmatamento de 555,4 mil hectares (5,5 mil km2), ou 15 vezes mais que em 2000. Em seis anos, 4% da área do Estado (cerca de 12 mil km2) foram desmatados com autorização legal. E a causa principal foi implantação de lavouras de cana-de-açúcar em áreas de vegetação nativa e de pastagens. Mas a fabricação de carvão também participa, principalmente no Nordeste do Estado. Segundo o prof. Laerte Ferreira, da Universidade Federal de Goiás, igualmente citado por este jornal (21/11/07), nem sequer a cobertura vegetal às margens de 45% das bacias hidrográficas tem sido preservada. Goiás, que já é o quinto maior produtor de cana, deve aumentar sua produção em 20% até o ano que vem.

Até onde se vai chegar? Segundo a Embrapa Monitoramento por Satélite, de fragmentos do Cerrado com possibilidade de sobrevivência (mais de 2 mil hectares contínuos cada), restam hoje em todo o país menos de 5% do bioma, menos de 100 mil km2. Fragmentos menores que esses dificilmente conseguirão resistir, porque as cadeias genéticas e reprodutivas não conseguem manter-se.

Quando o país se dará conta de que o Cerrado é tão importante para a biodiversidade brasileira – nossa maior riqueza, maior possibilidade de futuro -, para o clima, para a sustentabilidade da agricultura, quanto a Amazônia e a Mata Atlântica? Quando conseguirá o Congresso sair da letargia para tornar efetiva a proposta (que por lá tramita há 12 anos) de que o Cerrado e a Caatinga também sejam considerados patrimônio nacional? Quando deixaremos de encarar com olhos benevolentes a supressão do Cerrado por qualquer atividade econômica ? Já passou da hora. Se demorar mais, não haverá Cerrado para conservar como patrimônio nacional.

quinta-feira, 13 de dezembro de 2007

Jejuo também por democracia real

LUIZ FLÁVIO CAPPIO

Acusam-me de inimigo da democracia por estar em jejum e oração combatendo um projeto autoritário e falacioso: o da transposição. ACUSAM-ME de inimigo da democracia por estar em jejum e oração combatendo um projeto do governo federal autoritário, falacioso e retrógrado, que é o da transposição de águas do rio São Francisco.

Meu gesto não é imposição voluntarista de um indivíduo. Fosse isso, não teria os apoios numerosos, diversificados e crescentes que tem tido de representantes de amplos setores da sociedade, inclusive do próprio PT.

Vivêssemos uma democracia republicana, real e substantiva, não teria que fazer o que estou fazendo.

Um dos mais graves males da "democracia" no Brasil é achar que o mandato dado pelas urnas confere um poder ilimitado, aval para um total descompromisso com o discurso de campanha, senha para o vale-tudo, para mais poder e muito mais riquezas. Tráficos de influências, desvios do erário, porcentagens em obras públicas e mensalões são práticas tradicionais na política brasileira, infelizmente, pelo visto, ainda longe de acabar. A sociedade está enojada e precisa se levantar.

Há políticos -e, infelizmente, não são poucos- que, por onde passaram na vida pública, deixaram um rastro de desmandos, corrupção, enriquecimento ilícito etc. Como ainda funcionam o clientelismo eleitoral, a mitificação de personagens, as falsas promessas de campanha, o "toma-lá-dá-cá" e mais deseducação que educação política do povo, esses políticos conseguem se reeleger e galgar posições de alto poder em governos, quaisquer que sejam as siglas e as alianças.

Na campanha do candidato Lula, o tema crucial da transposição era evitado o máximo possível. Mas as campanhas eleitorais, à base do marketing e das verbas de "caixa dois" das empresas, são tidas e havidas como grandes manifestações do vigor de nossa democracia, que, com urnas eletrônicas, dá exemplo até aos EUA...

O projeto de transposição não é democrático, porque não democratiza o acesso à água para as pessoas que passam sede na região semi-árida, distante ou perto do rio São Francisco. O governo mente quando diz que vai levar água para 12 milhões de sedentos. É um projeto que pretende usar dinheiro público para favorecer empreiteiras, privatizar e concentrar nas mãos dos poucos de sempre as águas do Nordeste, dos grandes açudes, somadas às do rio São Francisco.

A transposição não tem nada a ver com a seca. Tanto que os canais do eixo norte, por onde correriam 71% dos volumes transpostos, passariam longe dos sertões menos chuvosos e das áreas de mais elevado risco hídrico. E 87% dessas águas seriam para atividades econômicas altamente consumidoras de água, como a fruticultura irrigada, a criação de camarão e a siderurgia, voltadas para a exportação e com seríssimos impactos ambientais e sociais.
Esses números são dos EIAs-Rima (Estudos de Impacto Ambiental/Relatório de Impacto sobre o Meio Ambiente), públicos por lei, já que, na internet, o governo só colocou peças publicitárias.

O projeto de transposição é ilegal e vem sendo conduzido de forma arbitrária e autoritária: os estudos de impacto são incompletos, o processo de licenciamento ambiental foi viciado, áreas indígenas são afetadas e o Congresso Nacional não foi consultado como prevê a Constituição.

Há 14 ações que comprovam ilegalidades e irregularidades ainda não julgadas pelo Supremo Tribunal Federal. Mas o governo colocou o Exército para as obras iniciais, abusando do papel das Forças Armadas, militarizando a região. A decisão do TRF (Tribunal Regional Federal) da 1ª Região, de Brasília, em 10/12 deste ano, obrigando a suspensão das obras, é mais uma evidência disso.

O mais revoltante, porque chega a ser cruel, é que o governo insiste em chantagear a opinião pública, em especial a dos Estados pretensos beneficiários, com promessas de água farta e fácil, escondendo quem são os verdadeiros destinatários, os detalhes do funcionamento, os custos e os mecanismos de cobrança pelos quais os pequenos usos subsidiariam os grandes, como já acontece com a energia elétrica. Os destinos da transposição os EIAs/Rima esclarecem: 70% para irrigação, 26% para uso industrial, 4% para população difusa.

Esses números são dos EIAs-Rima (Estudos de Impacto Ambiental/Relatório de Impacto sobre o Meio Ambiente), públicos por lei, já que, na internet, o governo só colocou peças publicitárias.
O projeto de transposição é ilegal e vem sendo conduzido de forma arbitrária e autoritária: os estudos de impacto são incompletos, o processo de licenciamento ambiental foi viciado, áreas indígenas são afetadas e o Congresso Nacional não foi consultado como prevê a Constituição.

Temos um projeto muito maior. Queremos água para 44 milhões de pessoas no semi-árido. Para nove Estados, não apenas quatro. Para 1.356 municípios, não apenas 397. Tudo pela metade do preço previsto no PAC para a transposição.

O Atlas Nordeste da ANA (Agência Nacional de Águas) e as iniciativas da ASA (Articulação do Semi-Árido) são muito mais abrangentes, têm prioridade no abastecimento humano e utilizam as águas abundantes e suficientes do semi-árido.

Fui chamado de fundamentalista e inimigo da democracia porque provoquei que o povo se levantasse e, disso, os "democratas" que me acusam têm medo. Por que não se assume a verdade sobre o projeto e se discute qual a melhor obra, qual o caminho do verdadeiro desenvolvimento do semi-árido? É nisso que consiste a nossa luta e a verdadeira democracia.

DOM FREI LUIZ FLÁVIO CAPPIO, 61, é bispo diocesano da cidade de Barra (BA) e autor do livro "Rio São Francisco, uma Caminhada entre Vida e Morte".

Veja aqui a carta que Dom Cappio enviou ao presidente Lula.

quarta-feira, 12 de dezembro de 2007

Bunge patrocina Ministério do Meio Ambiente

Bunge, uma das maiores processadoras de soja do Brasil e do mundo, está agora ensinando o mundo sobre “Responsabilidade Ambiental na Produção Agrícola”. Este é o nome da cartilha que o Ministério do Meio Ambiente lança hoje em Brasília. Segundo a própria assessoria do MMA, a publicação é fruto de parceria do ministério com a gigante do agronegócio. A Bunge tem sua marca frequentemente associada a casos de trabalho escravo, desmatamento desenfreado e à degradação do meio ambiente. Basta lembrar que se trata da empresa que mais investiu no monocultivo de soja em áreas de Cerrado, nos últimos anos.

Responsabilidade social ou marketing? A diferença entre estas duas ações junto à sociedade fica ainda menos clara quando são divulgadas associações insólitas como esta. Reportagem publicada pela Folha do Meio Ambiente, no dia 22 de novembro, denuncia abusos da multinacional Bunge e relatam o episódio em que a empresa foi obrigada a assinar Termo de Ajustamento de Conduta, por determinação da Procuradoria Geral da República, porque suas fazendas exploravam o trabalho escravo.

Pois está marcada para às 11 horas da manhã de hoje (12), no auditório do Blue Tree, num hotel de luxo de Brasília, o lançamento da cartilha do Ministério do Meio Ambiente, patrocinada pela Bunge. A presença do ministro interino, João Paulo Capobianco, está confirmada.

Leia reportagem da Folha do Meio Ambiente sobre a atuação da Bunge no Piauí.

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Nota de Esclarecimento

A assessoria de imprensa do Ministério do Meio Ambiente enviou à redação do *CURTAS* nota sobre matéria que publicamos no último dia 12, sob o título "Bunge patrocina MMA".

Segundo a assessoria, o MMA se limitou a atender à uma solicitação daquela empresa por assessoria técnica na elaboração de sua cartilha "Responsabilidade Ambiental na Produção Agrícola".

A nota não explica, no entanto, se faz parte desta assessoria técnica prestigiar, com a presença do ministro em exercício, o lançamento da publicação.

Leia a nota na íntegra:

Em relação à matéria circulada neste Blog intitulada "Bunge patrocina MMA", temos a retificar o seguinte: A Cartilha "Responsabilidade Ambiental na Produção Agrícola" é de propriedade da Bunge e se destina a seus inúmeros fornecedores e produtores rurais. A empresa solicitou o apoio técnico e revisão do Ministério do Meio Ambiente para, nomeadamente, oferecer informações sobre legislação, técnicas e boas práticas agrícolas destinadas ao setor. Como não poderia ser diferente, o Ministério não se furtou a colaborar, na medida em que considera como sua obrigação favorecer a divulgação de informações sobre aspectos legais com a expectativa de que isso leve à diminuição dos ilícitos e crimes ambientais, antes que esses ocorram, em especial em regiões muito impactadas como é o Cerrado. Em nenhum momento houve patrocínio ou repasse de recursos dessa empresa ao Ministério, como sugere o título da matéria.

Esperamos que esse esclarecimento alcance os leitores do renomado boletim.

Atenciosamente,

Ministério do Meio Ambiente

terça-feira, 11 de dezembro de 2007

Nova lei para acesso a recursos genéticos vai à consulta pública

Esta nota foi extraída da página do Ministério do Meio Ambiente. No final da matéria, há links para o anteprojeto e para documento que avalia a diferença entre ele e a MP 2.186-16, também elaborada pelo MMA.

O governo federal colocou em consulta pública, pela internet, o anteprojeto de lei sobre Acesso a Recursos Genéticos, Conhecimentos Tradicionais e Repartição de Benefícios. A proposta pretende substituir a atual Medida Provisória 2.186-16, de 2001, aprimorando a legislação no que se refere à pesquisa e bioprospecção e estabelecendo mecanismos para a repartição de benefícios com as comunidades indígenas e tradicionais. A consulta ficará no ar até 28 de fevereiro de 2008 no endereço eletrônico http://www.planalto.gov.br./

As sugestões ao anteprojeto poderão ser encaminhadas à Casa Civil da Presidência da República, Palácio do Planalto, 4o andar, sala 3, Brasília-DF, CEP 70.150-900, com a indicação "Sugestões ao projeto de lei que dispõe sobre o acesso aos recursos genéticos e seus derivados"; ou pelo e-mail: recursosgeneticos@planalto.gov.br .

No texto do documento está assegurado o cumprimento dos compromissos assumidos pelo Brasil junto à Convenção sobre Diversidade Biológica (CDB), que passou a vigorar a partir de 1993, principalmente no que diz respeito à questão da repartição de benefícios.

A Convenção da Biodiversidade Biológica reconheceu a soberania dos países sobre os recursos genéticos existentes em seus territórios. Isso alterou o entendimento de que estes recursos eram bens da humanidade e que poderiam ser explorados livremente. A partir deste marco legal, os países passaram a estabelecer regras para o acesso aos recursos genéticos, como forma de garantir que os benefícios decorrentes de sua repartição fossem distribuídos de maneira justa e eqüitativa, com apoio à conservação, à pesquisa e ao uso sustentável da biodiversidade.

Para resolver questões surgidas após a ratificação pelo Brasil da CDB, como a biopirataria, por exemplo, foi editada pela primeira vez, em junho de 2000, a Medida Provisória 2.186, eficiente em dar respostas às questões então colocadas, mas com várias lacunas para o desenvolvimento positivo das questões surgidas dos problemas relacionados ao acesso aos recursos genéticos.
Desde então, os setores diretamente envolvidos no assunto vêm se reunindo e debatendo a questão. O resultado deste debate está expresso, em parte, no anteprojeto agora colocado em consulta pública. O que se espera é que a participação neste processo possa aperfeiçoar a legislação.

Inovações

Entre as inovações propostas pelo anteprojeto está o estabelecimento de um tratamento abrangente e unificador à questão do acesso e à repartição de benefícios, estimulando seu uso ético e sustentável. Para isso, vai assegurar a definição de regras claras e garantir segurança jurídica para o uso dos recursos genéticos e seus derivados e dos conhecimentos tradicionais associados, fazendo com que diminua os custos de transação e elimine várias etapas da burocracia.

Na nova proposta de legislação, a etapa relacionada à pesquisa e à bioprospecção está mais flexibilizada. A proposta é facilitar o processo de acesso à coleta para pesquisa e torná-la menos onerosa. Pela atual legislação, antes de iniciar o processo o cientista era obrigado a pedir uma autorização ao Ibama. Pela nova proposta basta apenas informar sobre a atividade no Cadastro Nacional de Pesquisa.

Quanto à bioprospecção (atividade de investigação sobre algo da natureza com interesse em transformá-lo num produto econômico), o novo é a dispensa de contrato com o provedor, antes uma exigência, bastando apenas que se faça o registro da atividade também no Cadastro Nacional de Pesquisa.

No que diz respeito à repartição de benefícios a novidade é a instituição de uma Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide) a partir da qual os fabricantes de novos produtos comerciais contribuirão para dois fundos governamentais. Serão 50% destinados ao Fundo para Conservação e Repartição de Benefícios e 50% ao Fundo para Desenvolvimento Científico e Tecnológico. A cobrança da contribuição só ocorrerá uma vez e não ao longo de toda a cadeia.
O novo texto propõe ainda o estabelecimento de um sistema de gestão federal compartilhado, entre os ministérios do Meio Ambiente, Ciência e Tecnologia, Indústria e Comércio, Agricultura, Pecuária e Abastecimento.

A proposta é que haja uma queda no custo de toda a transação, pois a pré-definição das regras sobre a repartição permitirá um controle mais simples sobre a pesquisa em desenvolvimento. Um outra importante inovação é o financiamento direto de projetos de conservação e uso sustentável evitando fraudes e compra da terra para uso próprio.

Proteção

O Brasil detém cerca de 20% de toda a biodiversidade existente no mundo. São mais de 200 mil espécies nativas catalogadas, incluindo animais, plantas, fungos e microorganismos. Tudo isto equivale a apenas 10% do que existe no território e nas águas jurisdicionais brasileiras. O Brasil também possui uma variada sociodiversidade, com mais de 200 etnias indígenas e comunidades tradicionais, responsáveis pelo acúmulo de conhecimentos tradicionais associados à biodiversidade, decorrentes de seu estilo e modo de vida tradicionais.

A proteção e valorização adequadas deste patrimônio natural e cultural de forma ética e sustentável demonstraram a necessidade de aprimoramento da legislação sobre o assunto, no sentido de permitir sua utilização para o desenvolvimento social, econômico, científico e tecnológico do Brasil. Com as inovações da nova legislação, o que se pretende é a inserção da biodiversidade brasileira nas cadeias produtivas, detendo práticas de biopirataria e de apropriação indevida dos recursos genéticos e dos conhecimentos tradicionais associados.

Embora trate da regulamentação do acesso a recursos genéticos, o anteprojeto não disciplina atividades de extrativismo, nem atividades que utilizam a biodiversidade in natura, como o comércio de frutos, plantas ou animais, no todo ou de suas partes. Também não trata dos recursos genéticos das espécies exóticas.

A primeira iniciativa brasileira no sentido de regulamentar o acesso a recursos genéticos no Brasil ocorreu em 1995, com o projeto de lei 306/95 de autoria da então senadora pelo Acre, Marina Silva. Na ocasião, o projeto foi amplamente debatido por representantes de organizações não-governamentais, do setor privado, universidades e governos estaduais. O PL recebeu substitutivo que foi aprovado no Senado. No final de 1998 foi encaminhado à Câmara dos Deputados.

Veja também:

Anteprojeto de Lei

Diferenças entre a MP 2.186-16 e Anteprojeto de Lei

.: fonte: Suelene Gusmão - Ministério do Meio Ambiente

segunda-feira, 10 de dezembro de 2007

Cana está no limite em São Paulo

Apoiado nos argumentos da garantia da segurança do abastecimento interno e da sustentabilidade, o governo federal pretende dirigir a expansão das áreas destinadas ao cultivo de cana-de-açúcar e monitorar o interesse de empresas estrangeiras no promissor segmento dos biocombustíveis. A informação é do ministro da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, Reinhold Stephanes. Em entrevista exclusiva à Associação Paulista de Jornais, ele avalia as perspectivas do binômio etanol-biodiesel, transformado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) em “menina dos olhos” do setor energético.

O ministro anunciou a criação do “zoneamento agroclimático” para delimitar as áreas de crescimento da lavoura de cana. Segundo Stephanes, no Estado de São Paulo, o território ocupado pelo cultivo já estaria ‘no limite’.

“Vamos estabelecer um mapeamento restritivo, no qual o governo mostrará onde não deseja que se plante cana. Em outro conjunto de mapas, vamos estabelecer as áreas de expansão desejáveis, onde daremos incentivos”, afirmou.

Segundo o ministro, outra frente de ação governamental se dá no acompanhamento da “invasão multinacional” no setor. Nessa frente, a União rastreia as movimentações de empresas de outros países na aquisição de terras e desenvolvimento de projetos com usinas.

“Temos que ter esse controle para ver qual o grau de equilíbrio entre os nossos produtores e os eventuais produtores estrangeiros.”

À APJ, o ministro da Agricultura analisa ainda o impacto da política cambial no agronegócio.

Leia a seguir os principais trechos da entrevista.

Associação Paulista de Jornais - O “boom” do etanol e dos biocombustíveis coloca São Paulo em posição de liderança em um mercado que foi aberto basicamente com ações governamentais. Como o senhor avalia a perspectiva de expansão deste setor?

Reinhold Stephanes - O Estado de São Paulo é hoje responsável por quase 60% da produção do álcool. E tem efetivamente a estrutura mais forte e mais organizada, com tecnologia bastante desenvolvida, práticas consideradas boas, tanto sob o ponto-de-vista ambiental como social. A expansão em São Paulo, acho que até pelo preço da terra, está quase no limite. Talvez, dessa nova equação, em que a gente prevê um avanço de quase 4 milhões de hectares de área até 2015, 25% venham a se estabelecer em São Paulo e 75% fora do Estado, principalmente em Mato Grosso, Minas, Goiás e Paraná.

APJ - O ministério tem ações específicas para estimular e regular este segmento?

Stephanes - Acho que São Paulo se consolida por si só, o que vem ocorrendo através dos tempos. Em termos nacionais, o que vai se estabelecer é um zoneamento agroclimático. Para ver onde se pode plantar cana, que variedade de cana pode ter, que produtividade podemos obter. Vamos estabelecer um mapeamento restritivo, no qual o governo mostrará onde não deseja que se plante cana. Em outro conjunto de mapas, vamos estabelecer as áreas de expansão desejáveis, onde daremos incentivos. Claro que esses incentivos não alcançam mais as unidades já projetadas. Algumas em instalação e outras projetadas. Mas vão direcionar as novas unidades a serem planejadas.

APJ – Há uma preocupação relativa ao avanço sobre outras culturas e até sobre as pastagens.

Stephanes - Os estudos que temos mostram que, no momento, 70% da cana está em área de pastagem e 30% está avançando em cima da soja e, por sua vez, parte da soja está avançando em área de pastagem. Após o zoneamento, queremos que isso se acentue para que a gente chegue a 80% da expansão em área de pastagem. E como vamos também criar um programa de incentivo à recuperação de áreas de pastagens, possivelmente as áreas que faltarão serão ocupadas por soja.

APJ - O papel da Esalq, de Piracicaba, neste processo dos biocombustíveis, é fundamental, especialmente na área de pesquisa e busca de soluções de matrizes energéticas?

Stephanes - Frederico Durães, da Embrapa, é que está montando essa rede de pesquisa, mas evidentemente tem uma importância muito grande, pois é uma das nossas maiores unidades.

APJ – Como o governo tem agido no monitoramento da instalação de novas usinas?

Stephanes – As atuais já sabemos onde vão se instalar, que nós temos o mapeamento delas. As novas, nós vamos direcionar. Claro que não vamos proibir que elas sejam construídas em lugares em que elas sejam viáveis do ponto de vista agroclimático. Mas o governo evidentemente vai tentar direcionar para essas áreas degradadas ou áreas de pastagens. Isso, sim, vai se fazer.

APJ – É a política do governo Lula tentar inserir a agricultura familiar no programa do biodiesel. Os assentamentos poderão ser incorporados ao projeto?

Stephanes - Os assentamentos que estão situados em regiões onde a palma de dendê, por exemplo, pode ser uma planta viável podem ser (incorporados), pois temos a planta básica para que eles possam cultivar, que é econômica, que vai, enfim, dar renda que eles precisam. Já em outras áreas, nós precisamos de muita pesquisa para ver se é adequada para a produção de biodiesel. A planta mais adequada seria o pinhão manso, nós precisamos de cinco ou dez anos para tomar decisões mais efetivas. Tudo indica que o pinhão manso será uma planta promissora. Mas ela precisa deste tempo para ser domesticada e para que seu manejo correto seja conhecido. Temos que ir adaptando o programa, sem tirar a visão social do programa. Temos que ir adaptando isso de acordo com as possibilidades.
APJ - A perspectiva de inclusão social com esse programa é real?

Stephanes - O programa é inteligente, ele é bom na medida em que possa favorecer os pequenos produtores. Só que o governo tem que encontrar as plantas e as formas de produção que sejam lucrativas para estas pequenas propriedades.

APJ - Há hoje uma forte pressão para redução de carga tributária para o setor sucroalcooeiro e para usinas, especialmente quanto ao PIS-Cofins, até como forma de garantir geração de energia e evitar um novo “apagão”. O senhor vislumbra ações do governo no sentido de contemplar estes pleitos?

Stephanes – Isso vai depender da política de governo. Pode chegar em um determinado momento que o governo chega à conclusão de que precisa fazer isso. O que temos que entender é o seguinte: o programa do álcool tem 30 anos, teve seus altos e baixos. Está sendo construído e hoje é sucesso em todos os aspectos, inclusive em termos tecnológicos, temos o domínio total. Já na área do biodiesel, temos um caminho muito grande. O governo tomou uma decisão, criou um mercado, abriu um mercado e agora as coisas têm que se ajustar. A política de governo vai sendo firmada em determinadas diretrizes e toda pesquisa e o desenvolvimento agrícola também tem que se firmar em cima destas diretrizes. Mas ainda precisamos de tempo.

APJ – O ministério planeja utilizar algum novo mecanismo para controlar movimentação de preços do álcool? Muitas vezes, existe uma desproporcionalidade na velocidade em que as altas e baixas do produto são repassadas ao consumidor nas bombas...

Stephanes - Isso tem estado na pauta de discussão. Em praticamente em todas as reuniões, esse tema é recorrente. Só que não se encontra qual é a solução. Seriam basicamente duas possibilidades: ou manter estoques em nível do produtor ou fazer compras futuras para evitar esta volatibilidade de preços. Mas ainda não se chegou a saber qual é a solução. Então vamos conviver ainda um ou dois anos com essa volatibilidade que tem aí. Mas é uma discussão recorrente. E eu não saberia, como até agora ninguém soube me responder, qual será a melhor solução.

APJ - Qual o grau de interferência atual do governo nesta questão do preço?

Stephanes - Cada vez que encontro com os produtores de cana eu pergunto: como é que nós vamos resolver isso? Me dêem uma sugestão. Como sei que a ministra Dilma (Roussef, da Casa Civil) faz a mesma pergunta a cada reunião. Então, por enquanto, sem ter estoques reguladores para isso, mas não podiam ser estoques de governo, mas ainda é uma questão em discussão.

APJ - O governo tem rastreado as movimentações de empresas multinacionais em termos de aquisição de áreas e investimentos em etanol-biodiesel?

Stephanes - Por enquanto, é monitorar para ver o que está acontecendo. Quais são as áreas que eles estão comprando, qual é o nível de controle que eles vão exercer. Porque atrás de tudo isso tem outra discussão: o grande mercado de etanol quem abriu foi o próprio governo. Quase 80% do mercado está situado internamente, tenho uma frota interna para ser abastecida e essa frota é cada vez maior. Eu tenho que produzir para abastecer esse mercado interno e exportar o excedente. Então, com a liberdade que existe, já que não tenho outros mercados para buscar o produto, temos que ter um controle muito grande para dar esta segurança para o abastecimento. E se muitas empresas estrangeiras começarem a entrar aqui e começarem a fazer contratos para fora? Por isso temos que ter este controle para ver qual o grau de equilíbrio entre os nossos produtores e os eventuais produtores estrangeiros. Mas tudo indica que até agora não há nenhuma preocupação maior. Há apenas um acompanhamento desse movimento. Mas esse movimento ainda parece que é fraco.

APJ - O senhor tem dito que é preciso conter a euforia nesse segmento. O que quer dizer com este recado?

Stephanes - Em relação ao etanol, as perspectivas a médio prazo são excelentes, mas a curto prazo, os mercados ainda são promessas. Então tem que ir com certo cuidado, planejar melhor esse avanço, este crescimento. No caso do biodiesel, isso se acentua. Muitas empresas entraram com muita rapidez no mercado sem estarem seguras do que estão fazendo. Uma grande empresa que se baseia no plantio do pinhão manso, por exemplo, eu tenho muita dúvida se ela tem garantia científica de que isso efetivamente dê certo. Tenho chamado a atenção que elas façam isso com mais cuidado, com mais profissionalismo, mais base técnica, mais estudos. Embora compreendendo que todo o pioneirismo, leva um pouco a risco. Leva a grandes sucessos, como pode levar a fracassos.

APJ - Os fundamentos da macroeconomia hoje favorecem o agronegócio, em sua opinião? O câmbio, principalmente, é um problema para o setor.

Stephanes – A política cambial está ruim para o agronegócio. O que favorece é o cenário mundial, que aumentou os preços. E os preços tiveram um movimento para cima porque o dólar se desvalorizou frente às demais moedas do mundo. Evidentemente, como as cotações são em dólar, geralmente Chicago e Nova York (bolsas), claro que os produtos tiveram que subir de preço na medida em que o dólar foi desvalorizado. E o segundo movimento foi que o mundo está demandando mais. Então o que aconteceu? O nosso produtor brasileiro ainda está em situação razoável porque houve um aumento do mercado internacional. Agora, evidente que se o dólar estivesse melhor, ele teria mais condições de capitalizar, de ganhar algum dinheiro. Dos produtos brasileiros que estão sendo comercializados no mercado internacional, o que está efetivamente com problema é o café. Os demais, devido a esse movimento de alta, conseguem se manter.

APJ – O pequeno produtor, especialmente, pede mais acesso ao crédito. O senhor enxerga chance de o governo ampliar as linhas por meio dos bancos estatais e de outros mecanismos?

Stephanes – Eu não sei bem a questão do microcrédito, mas eu posso assegurar que o Pronaf (Programa Nacional de Agricultura Familiar) está funcionando bem, está com recursos. Tem crescido todo ano. Eu não tenho tido muita reclamação nesta área. Por enquanto, em termos de acesso ao crédito, eu estou considerando as coisas normais.

APJ – Os produtores de laranja e a indústria do suco vivenciam uma queda-de-braço quanto à política de preços, especialmente. O governo vai manter a posição de não interferir neste processo?

Stephanes – Quanto a isso, eu posso dizer que não há mudança. Como uma regra, a gente procura fazer com que a própria cadeia se entenda. A tendência é que a gente não intervenha em casos como esse.

.: fonte: APJ.

sexta-feira, 7 de dezembro de 2007

Centru lança projeto de capacitação agroextrativista

O Centru (Centro de Educação e Cultura do Trabalhador Rural) lançará, no próximo dia 12, o projeto "Agroextrativismo: alternativa sustentável e solidária aos povos do Cerrado maranhense - escola técnica agroextrativista". Com apoio da Petrobrás, o projeto visa capacitar profissionalmente 120 famílias agroextrativistas. Serão cerca de 360 mulheres e jovens beneficiados diretamente. A cerimônia de lançamento será no município de João Lisboa, a 13 quilômetros de Imperatriz, e irá das 9 horas ao meio-dia.

O Maranhão tem hoje quase 70% da sua população vivendo abaixo da linha da pobreza. As famílias de trabalhadores rurais perdem seus espaços produtivos frente à expansão dos latifúndios e empreendimentos, que vislumbram em seu planejamento a implantação cada vez maior da monocultura. Por se tratar da raiz do problema da miséria e da fome nos campos brasileiros – especialmente no Nordeste -, torna-se urgente repensar este modelo de desenvolvimento, adequando-o à realidade dos agricultores familiares e suas organizações.

A busca desse novo modelo passa pela concepção de uma agricultura que possa manter-se a partir de seus próprios recursos naturais, reduzindo a sua dependência a insumos agroindustriais, sem abrir mão da eficiência e que contemple aspectos ambientais, sociais, culturais, econômicos, sendo, portanto, auto-sustentável e solidária em todos os seus aspectos.

São estes os fundamentos da proposta que o Centru-MA apresentou ao edital Petrobrás Fome Zero, e que foi aprovada. O projeto envolve seis municípios integrantes da rede de cooperativas de agriculturores e agroextrativistas familiares maranhenses. São eles: Amarante (COOPRAMA), Imperatriz (COOPAI) e Montes Altos (COOPEMI), Pólo Oeste e Estreito (COOPAEMA), São Raimundo das Mangabeiras (COOPEVIDA) e Loreto (COOPRAL). Outros quatro municípios que compõem a área de abrangência do Centru-MA (João Lisboa, Buritirana, Senador La Roque e Cidelândia) também serão beneficiados pelo projeto.

O Maranhão é um dos nove estados que compõem a Amazônia Legal. Situando-se entre as regiões Norte e Nordeste, o que confere uma denominação especial de "estado da região meio-norte", apresenta formações vegetais de transição para a floresta amazônica ao norte/centro-oeste e, ao sul, vegetação característica de cerradão, cerrado e veredas, sendo essas fito-regiões separadas pelo Bioma Cerrado.

Jogo Rápido:

Evento: Lançamento do projeto "Agroextrativismo: alternativa sustentável e solidária aos povos do Cerrado maranhense - escola técnica agroextrativista".

Organização: CENTRU -MA

Data: Dia 12 de dezembro, de 9 às 12 hs.

Local: Ginásio de Esportes da João Lisboa (13 quilômentros de Imperatriz – MA)

Informações: Telefax: 99 3526 4944 / E- mail: centru@jupiter.com.br

quinta-feira, 6 de dezembro de 2007

Movimentos sociais bloqueiam ponte sobre Velho Chico em apoio a Dom Luiz Cappio


Edição eletrônica de hoje do jornal A TARDE informa sobre mobilização de movimentos sociais de municípios baianos em apoio ao bispo Dom Luiz Cappio, que está em greve de fome pelo fim das obras de transposição de águas do rio São Francisco. Durante as manifestações, foi fechada a passagem pela BR 242, na ponte sobre o Velho Chico, fazendo com que motoristas esperassem até cinco horas para poder seguir viagem.

Abaixo, a matéria na íntegra.

Protesto de apoio a Dom Cappio
Miriam Hermes, da Sucursal Barreiras

Cerca de mil pessoas dos movimentos sociais organizados do Médio São Francisco e católicos das dioceses de Barra, Irecê, Bom Jesus da Lapa, Barreiras e Vitória da Conquista reuniram-se nesta quarta-feira em Ibotirama (660 km de Salvador, no oeste do Estado), para apoiar o bispo de Barra, Dom Luiz Cappio, em greve de fome pelo fim das obras de transposição.

Com músicas, faixas e cartazes pedindo a revitalização da bacia hidrográfica, por volta das 5 horas da manhã o grupo fechou a passagem na BR 242, sobre a ponte no rio São Francisco, onde motoristas e passageiros chegaram a esperar por cinco horas para seguir viagem, haja vista que de duas em duas horas uma das vias foi liberada, impedindo que se formassem filas com mais de 10 km, nos dois sentidos da rodovia.

Indiferentes às razões do protesto, a maioria dos viajantes parados na estrada sob um calor de 39 graus centígrados, se mostrou revoltada com o movimento. De acordo com o agente da PRF, Luciano Souza, ocorreram casos extremos como doentes, crianças e idosos que necessitaram de cuidados especiais. "Eu mesmo socorri dois idosos com princípio de enfarto até o Hospital de Ibotirama", afirmou.

O movimento foi encerrado no final da tarde com uma caminhada pelas ruas da cidade e um evento ecumênico de orações na margem do rio São Francisco. "Nós apoiamos a greve de fome do bispo Dom Luiz Cappio, pois ele está defendendo todo o povo que mora e que depende deste rio e seus afluentes", destacou o coordenador regional do Movimento dos Trabalhadores assentados, acampados e quilombolas (Ceta), Bartolomeu Guedes, 39 anos, do município de Serra do Ramalho.

Para a coordenadora da Câmara Consultiva do Médio São Francisco, Edite Souza, a falta de diálogo por parte do governo sobre a transposição provocou essa situação. "Por isso, como Dom Luiz, nós queremos projetar o assunto na sociedade, para que ela também se dê conta do erro que é esse projeto, enquanto que as pessoas do Vale estão precisando de água não só para beber, mas também para produzir com sustentabilidade", salientou.

"Estamos aqui porque não podemos perder o bispo Dom Luiz", enfatizou o trabalhador rural Josias Pereira de Souza, 61 anos. Assentado em um projeto de Reforma Agrária do município de Muquém do São Francisco, ele se emocionou ao lembrar do bispo. "Ninguém conhece este rio e seus moradores como ele, que caminhou um ano da nascente à foz e há mais de 30 anos mora na nossa região".

Falta conhecimento

A agricultora e estudante de zootecnia, Isabel Gualberto da Silva, 58 anos, foi enfática ao dar seu recado ao presidente da república: "Não deixe o Frei Luiz morrer, porque ele não vai sozinho. Tem mais gente nesta briga, que é nacional e internacional".

Ela, que mora no município de Lapão e viajou 8 horas de ônibus para participar do movimento, disse que agora quer ir ver Dom Luiz em Sobradinho "porque quanto mais gente tiver com ele, maior será a força contra essa transposição".

Preocupada com a saúde do bispo, Isabel disse querer acreditar que o Governo Federal vai se sensibilizar com a postura do religioso e as manifestações de apoio que ele vem recebendo, "e vai propor um diálogo aberto e franco, como ficou acertado no fim da primeira greve de fome". Para ela, falta conhecimento por parte dos brasileiros em geral acerca do projeto de transposição "que vai consumir muito dinheiro público e vai atingir principalmente projetos empresariais, ao invés de beneficiar os trabalhadores mais necessitados", afirmou.

quarta-feira, 5 de dezembro de 2007

O Brasil rural que temos e o que queremos é tema da I Conferência Nacional do Condraf

O recente, repentino e estratosférico salto do preço do quilo de feijão, que passou de R$ 2,30 para R$ 5,98, soou como um alarme para organizações e indivíduos que se preocupam com as políticas públicas de desenvolvimento no país, principalmente em tempos de biocombustíveis. Este foi um dos pontos debatidos na reunião preparatória da I Conferência Nacional de Desenvolvimento Rural Sustentável e Solidário, marcada para acontecer no primeiro semestre de 2008.

A conferência, que será em Recife, Pernambuco, entre os dias 25 e 28 de junho, tem como tema geral “Por um Brasil Rural com Gente: Sustentabilidade, Inclusão, Diversidade, Igualdade e Solidariedade”. A reunião de preparação foi realizada no dia 30 de outubro e contou com a participação de Irene dos Santos, do Instituto Brasil Central (IBRACE), representante da Rede Cerrado, no Condraf.

Irene avalia que se trata de uma importante oportunidade de se discutir quais são as políticas existentes para o desenvolvimento rural e sustentável no Cerrado. “Esse é o momento para fazer uma avaliação!", afirma.

As etapas da conferência nacional já estão em andamento seguem o seguinte calendário:

CONFERÊNCIAS

  • municipais, intermunicipais e territoriais – de 01 de novembro a 30 de janeiro de 2008

  • estaduais - 15 de março a 30 de abril de 2008

  • nacional - 25 a 28 de junho de 2008.

A próxima reunião preparatória será no dia 18 de dezembro. Para mais informações, visite a página do Condraf em www.mda.gov.br/condraf.

terça-feira, 4 de dezembro de 2007

Cana-de-açúcar avança em áreas prioritárias


Mapas elaborados pelo Instituto Sociedade, População e Natureza estabelecem a nova geografia do etanol no segundo bioma mais ameaçado do país.

Importantes áreas para a conservação e uso sustentável da biodiversidade do Cerrado que deveriam ser protegidas estão sendo tomadas pelas lavouras de cana-de-açúcar para produção de etanol. Isso significa que pode haver comprometimento dos recursos naturais, das populações rurais e da segurança alimentar na região. A conclusão é de um levantamento feito pelo Instituto Sociedade, População e Natureza (ISPN) e que aponta a tendência do avanço dos canaviais no segundo bioma mais ameaçado do país. O estudo foi financiado com recursos da Comunidade Européia.

O Cerrado abrange cerca de dois milhões de quilômetros quadrados e faz conexão com a Amazônia, a Mata Atlântica, o Pantanal e a Caatinga. Sua área central está nos estados de Goiás, Distrito Federal, Tocantins, Minas Gerais, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, sul do Maranhão, oeste da Bahia e parte do estado de São Paulo. Abrange ainda uma pequena porção no Paraná e enclaves localizados em Roraima, no Amapá e extremo norte do Pará.

“Apesar de não haver monitoramento oficial, estima-se que o desmatamento na região gire em torno de 1,1% ao ano, o equivale à destruição de cerca de 22 mil Km2 por ano, sendo maior que o desmate na Amazônia” compara Nilo D’Avila, assessor de políticas públicas do ISPN. Nas últimas décadas, o Cerrado já perdeu a metade de sua cobertura vegetal. As principais causas do desmatamento no Cerrado estão relacionadas à agricultura e pecuária praticadas inclusive sobre áreas que deveriam estar sob proteção e que são a base do estudo do ISPN.

Os mapas que mostram a nova geografia do etanol no Cerrado foram elaborados a partir de dados o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e do Ministério do Meio Ambiente (MMA). Ao cruzar os dados, o ISPN detectou situações que apontam riscos para a biodiversidade, a água e o clima na região.

Nos municípios de Goianésia e Barro Alto, em Goiás, uma área de cerca de 2, 5 mil km2 considerada pelo MMA como “prioridade muito alta para o fomento e uso sustentável” já está dominada pela cultura da cana. A situação se repete em outra áreas do estado.

Na região que engloba as nascentes do rio São Lourenço – um dos mais importantes do Mato Grosso – as lavouras de cana avançam sobre áreas onde se tenta implementar um corredor de biodiversidade. Nesse caso, a produção canavieira se concentra nos municípios de Dom Aquino, Jaciara e Juscimeira.

Em Minas Gerais, estado que também está vivendo a expansão da monocultura da cana, o levantamento aponta exemplos como o do polígono que envolve os municípios de Lagoa da Prata, Luz, Arcos, Iguatama e Japaraíba e que tem “muito alta prioridade” para a conservação ambiental. Lá também a cana se espalha.

Na região central do estado de São Paulo, uma área considerada como “prioridade extremamente alta” para consolidar e conectar Unidades de Conservação agora convive com extensos canaviais. A Reserva Biológica (REBIO) localizada no município paulista de Sertãozinho é vista nos mapas como uma ilha cercada de cana por todos os lados.

“O governo precisa se antecipar e direcionar a expansão da cana-de-açúcar para áreas já alteradas se quiser evitar perdas inestimáveis para a biodiversidade do Cerrado e impacto indesejáveis sobre os recursos hídricos e o clima”, alerta o professor Donald Sawyer, do Centro de Desenvolvimento Sustentável da Universidade de Brasília.

Usinas projetadas para o Cerrado indicam novas áreas da expansão da cana

O estudo realizado pelo ISPN também apresenta a tendência regional de expansão da cultura da cana a partir de São Paulo para os estados vizinhos de Minas Gerais, Mato Grosso do Sul e projeção para Goiás, Mato Grosso e Tocantins.

De acordo com o assessor de políticas públicas do ISPN, Nilo D’Avila, o levantamento revela que enquanto a indústria da cana já tem já definiu a ampliação de área plantada e construção de novas usinas – inclusive em regiões onde ainda não há lavouras de cana – o governo não apresenta um plano para se preservar importantes amostras do bioma.

“O governo fala muito em evitar a expansão da cana para a Amazônia. Enquanto isso, o avanço dos canaviais se dá de modo rápido e descontrolado no Cerrado”, compara D’Ávila. Com base nos novos mapas, ele contabiliza para o estado de São Paulo 27 novas usinas. Goiás, que já tem 17 usinas instaladas, deverá saltar para um total de 40 com as novas unidades previstas. Minas Gerais tem 31 usinas instaladas e deverá ganhar mais 14. Em Mato Grosso do Sul, há 10 usinas instaladas em 15 em construção.

“Ao mapear o avanço da estrutura para o processamento da cana sobre o Cerrado, o levantamento questiona a capacidade do governo para monitorar e controlar o desmatamento no bioma”, explica Nilo D’Avila. Ao contrário da Amazônia, o Cerrado não dispõe de um sistema de vigilância permanente e muito menos uma política pública que conjugue o crescimento econômico com a preservação de áreas importantes para a manutenção dos serviços ambientais do Cerrado.

Impactos sociais

Os impactos sociais do avanço descontrolado da indústria na cana no Cerrado também são motivo de preocupação. Segundo a antropóloga Andréa Lobo, presidente do ISPN, o desmatamento para dar lugar à lavoura de cana prejudica diretamente as populações rurais que sobrevivem do uso da biodiversidade do Cerrado.

Outra conseqüência temível é que os pequenos produtores de alimentos deixem suas plantações atraídos pelos empregos temporários no corte da cana, o que poderá diminuir a produção de alimentos na região, além de agravar a migração para as periferias urbanas.

Para Andréa Lobo, o estudo mostra a necessidade urgente de se definir políticas que consigam enfrentar a nova realidade que se desenha sobre o bioma Cerrado. Conforme a antropóloga, não se trata de excluir uma alternativa econômica importante para o país como o etanol, mas de preservar as áreas de interesse ambiental global e incluir as populações que vivem no Cerrado no processo de desenvolvimento sustentável da região.

.: fonte: ISPN

Para conhecer outros mapas produzidos pelo levantamento, visite: www.ispn.org.br

Veja também a repercussão do levantamento na grande imprensa:

.: G1



domingo, 2 de dezembro de 2007

Rede Cerrado manifesta apoio a Dom Frei Luiz Cappio

Dom Frei Luiz Cappio, 2007.

Desde o dia 27 de novembro, Dom Frei Luiz Cappio, bispo da diocese de Barra (BA), encontra-se em greve de fome contra o projeto de transposição do Rio São Francisco.

Essa não é a primeira manifestação do bispo contra a transposição. Em setembro de 2005, Frei Dom Luiz Cappio já havia feito uma greve de fome. Na ocasião, o governo prometeu abrir um diálogo sobre o projeto. Em dezembro de 2005, frei Luiz reuniu-se em Brasília com Lula, com quem negociou a realização de uma rodada de debates. Em 2006, porém, o diálogo entre governo e sociedade civil sobre a transposição foi sendo graduamente suspenso, à medida em que as eleições se aproximavam. Somente em janeiro de 2007, o governo voltou a se posicionar abertamente com relação ao projeto, incluindo-o na lista de grandes obras do Programa de Aceleração de Crescimento (PAC).

Em carta ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva, Dom Frei Luiz Cappio pede o arquivamento imediato do projeto e explica as motivações do jejum. Dom Frei Luiz Cappio fala na desilução causada pela quebra de compromisso, por parte do presidente, e reafirma sua convicção de que a transposição não atenderá à população pobre do semi-árido, mas sim às empreiteiras responsáveis pela obra, a grandes proprietários de terra, produtores de camarão do litoral e a empresários ligados a setores exportadores. Para o bispo a melhor alternativa para a população em geral são as 530 obras sugeridas pela Agência Nacional de Águas (ANA), em seu Atlas do Nordeste e que seriam suficientes para abastecer os 1,3 mil municípios da região com mais de 5 mil habitantes a um custo muito inferior ao da transposição: R$ 3,6 bilhões contra R$ 6,6 bilhões. Para o meio rural, Dom Frei Luiz Cappio aposta nas alternativas de convivência com a seca, desenvolvidas no âmbito da Articulação do Semi-Árido (ASA).

Em apoio ao protesto de Dom Frei Luiz Cappio, a Rede Cerrado lançou uma carta, conclamando todos seus associados e parceiros a se posicionarem junto ao Governo Lula, para que suspenda imediatamente a execução do projeto de transposição do São Francisco e reabra o diálogo com a sociedade civil.

Conheça aqui a carta de apoio da Rede Cerrado ao bispo Dom Frei Luiz Cappio.