segunda-feira, 3 de março de 2008

Evento reúne Povos do Cerrado Norte Mineiro


Cerca de 250 pessoas participaram do Encontro Regional da Rede Cerrado, realizado em Montes Claros, nos dias 29 de fevereiro e 1 de março. Estiveram presentes no evento representantes de comunidades e populações tradicionais do Norte de Minas Gerais - entre vazanteiros, geraizeiros, quilombolas e indígenas -, estudantes e professores universitários, representantes de organizações não governamentais da região e autoridades. Integrado à 18ª Festa Nacional do Pequi, e organizado pelo Centro de Agricultura Alternativa do Norte de Minas – CAA/NM, o evento foi considerado um sucesso.

Para a coordenadora geral da Rede Cerrado, Mônica Nogueira, o encontro foi um momento alto no processo que chama de "enraizamento" da Rede. “Estamos numa fase em que a Rede Cerrado se volta para o fortalecimento e ampliação de sua base social nos diferentes estados”, comenta Mônica.

Participaram também do evento o Deputado Estadual Almir Paraka (PT-MG), o Delegado Regional do Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA), Rogério Baptista Correia e o Presidente da Fundação Banco do Brasil (FBB), Jacques Penna. Membros do Conselho Deliberativo da Rede Cerrado, dos estados do Maranhão, Mato Grosso do Sul, Tocantins e outras regiões de Minas Gerais, como o Triângulo Mineiro e o Vale do Jequitinhonha, enriqueceram as discussões. Quem participou do evento, pôde ter uma visão ampla do Cerrado e de seus Povos.

União de esforços para lidar com as contradições e obstáculos

Os representantes de comunidades tradicionais deram depoimentos tocantes, durante as quatro sessões de discussões do encontro. Reconheceram na Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais uma importante oportunidade política, mas também apontaram para as resistências que ainda persistem ao reconhecimento de seus direitos territoriais, seja por parte do governo ou da sociedade. Para esses representantes, há uma verdadeira ofensiva de alguns setores da sociedade contra o reconhecimento de quilombos e demais territórios tradicionais.

Além do reconhecimento de seus direitos territoriais, as populações tradicionais também têm reivindicações relativas ao marco legal e às políticas de estímulo da produção e comercialização. Hoje, a legislação sanitária e tributária brasileira dificulta a inclusão dos produtos dessas comunidades. A necessidade das comunidades nesta área pode ser resumida em dois pontos: regularização dos produtos e redução da carga tributária. O objetivo maior é ilustrado pela produtora agroextrativista Rosana Claudina da Costa Sampaio "nós queremos ter a dignidade de viver do que produzimos e não ficar dependentes de auxílios e bolsas do governo".

Para alguns, o Governo Lula guarda profundas contradições. Ao lado da festejada Política Nacional para Povos e Comunidades Tradicionais, tem levado adiante projetos como a transposição do rio São Francisco, que fere os interesses e direitos de muitas populações tradicionais da região e certamente implicará em degradação ambiental.

O caminho vislumbrado pelos participantes do encontro para lidar com tais contradições foi o da união de esforços. O reconhecimento da importância estratégica de uma aliança entre os Povos do Cerrado (indígenas, quilombolas e camponeses), técnicos, intelectuais e estudantes fez do encontro também um momento de celebração da força coletiva.

Próximos passos

Com a tarefa de dinamizar as discussões, formular posições e implementar ações para tornar a Política Nacional uma realidade no Norte de Minas Gerais, ao final do encontro, foi instituída oficialmente a Comissão Regional dos Povos e Comunidades Tradicionais, composta por representantes quilombolas, indígenas, vazanteiros e geraizeiros.

Novos encontros regionais da Rede Cerrado também serão realizados. O próximo será no Oeste da Bahia, seguido por um encontro conjunto dos estados do Maranhão e Tocantins, ainda no primeiro semestre deste ano.

A idéia é que os encontros regionais, enquanto uma estratégia de mobilização e articulação política, calcem o caminho para a realização do já tradicional Encontro e Feira dos Povos do Cerrado - esse de caráter nacional.

A despedida de um companheiro de caminhada

Vanderlei de Castro, falecido no último dia 27, foi lembrado com um toré (ritual indígena), conduzido por Emílio Xakriabá. Uma justa homenagem para quem teve uma forte relação com a cultura indígena e seus representantes. O próprio Vanderlei era descendente de Bororo e teve uma estreita relação com os Xavante, com quem desenvolveu experiências de repovoamento de matas de Cerrado com espécies silvestres, como queixada, cateto e capivara.

Vanderlei também desenvolveu, em conjunto com outros produtores agroextrativistas do município de Diorama, GO, um sistema integrado de produção agroecológica, envolvendo o enriquecimento e manejo de espécies da flora nativa de Cerrado, a desidratação solar de frutos e a produção de fitoterápicos.

Além das saudades, lembra o pesquisador Igor Homem de Carvalho, Vanderlei deixa um importante patrimônio de idéias, tecnologias e experiências práticas de uso sustentável da biodiversidade do Cerrado.

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