segunda-feira, 23 de maio de 2011

Comissão Nacional dos Povos e Comunidades Tradicionais aprova moção contra o PL do Código Florestal

Comissão Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais

Brasília, 19 de maio de 2011

À Presidenta Dilma Roussef

Nós, representantes de povos e comunidades tradicionais de todas as regiões do Brasil, reunidos em Brasília no âmbito da Comissão Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais – CNPCT (Decreto de 13 de julho de 2006), requeremos à Presidenta Dilma Roussef que empenhe todos os seus esforços para cumprir seu compromisso de campanha e impedir que a proposta de alteração do Código Florestal relatada pelo Deputado Aldo Rabelo e formulada pela bancada ruralista na Câmara dos Deputados (PL 1876/09) prospere.

Dentre os graves problemas que a proposta apresenta destacamos:

a) anistia de recomposição de reserva legal não apenas para a agricultura familiar, como defendem os movimentos sociais e ONGs socioambientais, mas para todos os imóveis rurais do País com área total de até 4 Módulos Fiscais (art. 13, §7º). De acordo com estudo do IPEA essa anistia abrigará mais de 135 milhões de hectares em todo país, ou mais do que o dobro de toda área de agricultura no Brasil.

b) supressão do poder regulamentar do CONAMA sobre as hipóteses de utilidade pública, interesse social e baixo impacto, além dos parâmetros de APP (art. 8º), o que afronta o principio da democracia participativa.

c) redução na proteção das áreas de preservação permanente, reduzindo pela metade a área a ser recomposta em rios de até 10 metros (art.35), permitindo pecuária em topos de morro e áreas de uso restrito - entre 25 a 45º de declividade (arts. 10 e 12), e retirando proteção a manguezais e veredas (art. 3º), atualmente protegidos. Vale dizer que a anistia proposta para as APP de rios com menos de 10 metros de largura, além de contrariar recomendação expressa feita pela Agência Nacional de Água – ANA, afetará mais de 55% de toda a malha hídrica do País de acordo com estudo da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência.

d) causará estímulo a novos desmatamentos ao permitir que não somente desmatamentos anteriores a julho de 2008 sejam regularizados com recomposição com espécies exóticas, que sejam compensados por vegetação em outros estados, no mesmo Bioma (art. 38), ou que possam ser beneficiados com redução da RL na Amazônia legal para fins de “regularização”(art. 14, I). Vale lembrar os dados do INPE lançados em 18 de maio deste ano dando conta de um aumento inesperado e significativo dos desmatamentos na Amazônia neste ano.

e) desobrigação aos órgãos ambientais de embargar os novos desmatamentos ilegais permitindo o acesso de novos desmatadores ilegais a crédito público (Art. 58) e quebrando portanto a espinha dorsal da política nacional de controle do desmatamento.

f) a anistia pode ser adiada indefinidamente por decreto (art. 33, §2o)

Os graves problemas acima descritos indicam claramente que a proposta de Lei em questão atende fundamentalmente à parte mais retrógrada do setor agropecuário brasileiro, aponta na contra mão da história do desenvolvimento sustentável e contra os compromissos assumidos internacionalmente e por Lei (Lei de Mudanças Climáticas) pelo presidente Lula em Copenhague (2009) de reduzir significativamente até 2020 nossas emissões de gases de efeito estufa.

De acordo com o próprio INPE e o Ministério de Meio Ambiente a expectativa de anistia gerada pelos debates em torno da proposta ruralista em questão já trouxe impactos reais na retomada do aumento do Desmatamento na Amazônia, após 5 anos de queda significativa.

Salientamos que nós, Povos e Comunidades Tradicionais, defendemos a manutenção das áreas de reserva legal e APP´s, pois dependemos dessas áreas para a manutenção do nosso modo de vida, cultura, economia e produção de alimentos. Ressaltamos que as mudanças no código florestal vigente devem ser fruto de um debate amplo com toda sociedade brasileira e que nós povos e Comunidades Tradicionais não participamos do debate que originou a proposta em pauta.

Diante de todo o exposto até aqui é que reiteramos nosso pedido de que Vossa Excelência impeça a aprovação da proposta em questão, já fruto de suposto acordo com o governo, para votação na próxima terça-feira (24) e que o Governo apresente uma proposta de Lei para uma política nacional florestal condizente com o papel de destaque e a importância do Brasil (Potência Socioambiental) para as ações globais de mitigação às mudanças climáticas, conservação da Sociobiodiversidade e das águas e melhoria da qualidade de vida na Terra.

Aprovado na 16ª Reunião Ordinária da Comissão Nacional de Desenvolvimento Sustentável para Povos e Comunidades Tradicionais.

segunda-feira, 2 de maio de 2011

Carta aberta da Rede Cerrado em defesa do Código Florestal Brasileiro

Nós, membros da Rede Cerrado de ONGs e Movimentos Sociais, articulação que congrega centenas de instituições com atuação no bioma Cerrado, representando trabalhadores/as rurais, agroextrativistas, povos indígenas, quilombolas, comunidades tradicionais da região, como geraizeiros, quebradeiras de coco, pescadores artesanais e profissionais de organizações não governamentais de assessoria, engajadas na defesa desse Bioma e de seus povos, manifestamos nosso posicionamento em defesa do Código Florestal Brasileiro.

Reconhecemos os esforços do Ministério do Meio Ambiente no sentido de promover um debate sério e qualificado junto ao Governo Federal, ao Congresso Nacional e à sociedade civil acerca das propostas de alteração da legislação ambiental brasileira, abrindo caminhos para a construção de uma reforma do Código Florestal que incorpora demandas dos diversos segmentos, aliando sob uma ótica sustentável as perspectivas de produção rural e conservação.

Neste sentido, entendemos que é fundamental garantir:

- a manutenção das definições e dimensões das Áreas de Preservação Permanente (APPs), para a proteção de nascentes e cursos d’água, de ecossistemas frágeis, da biodiversidade nativa e para evitar riscos de desastres como os ocorridos em 2008 na bacia do Itajaí, em Santa Catarina, e no início de 2011, no Rio de Janeiro, com perda de vidas e grandes prejuízos materiais;
- a manutenção dos percentuais de Reserva Legal (RL), facilitando os procedimentos para o uso sustentável de sua biodiversidade, a partir de planos de manejo simplificados no caso dos agricultores familiares; e garantindo a manutenção dos corredores biogeográficos, evitando assim extinção das espécies da fauna e flora brasileira;
- a incorporação do conceito de “agricultura familiar” de acordo com art. 3º da Lei Federal 11.326, de 24 de julho de 2006 (que estabelece as diretrizes para a formulação da Política Nacional da Agricultura Familiar e Empreendimentos Familiares Rurais);
- condicionar a anistia das multas para proprietários que desmataram suas áreas irregularmente até 22 de julho de 2008 (Decreto 6.514/2008) à adesão ao Programa Mais Ambiente (Decreto 7.029/2009);
- a compensação de Reserva Legal (RL) na mesma microbacia, observando os critérios de equivalência em extensão e importância ecológica das áreas.

Consideramos ainda como crucial uma sólida estratégia governamental no sentido de apoiar os proprietários rurais que aderirem ao Programa Mais Ambiente com ampla assistência técnica qualificada para a adequação ambiental de suas propriedades.
Entendemos que a valorização da floresta em pé, por meio do fortalecimento de iniciativas que promovam o uso sustentável da biodiversidade nativa, é uma estratégia fundamental para garantir geração de renda no campo, manutenção de modos de vida tradicionais e de serviços ecossistêmicos em larga escala.

Assim como apontado pelos cientistas da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) e da Academia Brasileira de Ciências (ABC), entendemos que, para a reforma do Código Florestal, “o conceito principal deverá ser o da construção de uma legislação ambiental estimuladora de boas práticas e garantidora do futuro e que proporcione, como política pública, a construção de paisagens rurais com sustentabilidade social, ambiental e econômica”.

Defendemos políticas democráticas e participativas que enxerguem o Brasil como uma nação multicultural e biodiversa. Onde o desenvolvimentismo a qualquer custo e o conservacionismo de uma natureza mítica e intocável devem dar lugar a uma abordagem na qual o patrimônio natural e cultural devem ser fundadores de uma nova ordem política. Onde florestas, savanas, cerrados, pantanais, caatingas, campos, restingas e manguezais e os seus povos devem ser reconhecidos, respeitados e considerados em uma estratégia de desenvolvimento e de sustentabilidade nacional e planetária.

Cerrado, 29 de abril de 2011

Rede Cerrado